Depois da divulgação de um acordo firmado entre o Ibama e a Norte Energia que, na última semana, permitiu que a empresa adotasse o chamado Hidrograma B na Volta Grande do Xingu (trecho de cerca de 130 km do rio cujo fluxo de água passa a ser cerca de um décimo da vazão natural), o Movimento Xingu Vivo, a Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH) e representantes de cerca de 20 comunidades ribeirinhas, de pescadores, de agricultores e indígenas protocolaram no Ministério Público Federal uma representação contra os responsáveis pelos danos ambientais causados à região.
Já na semana que se seguiu ao acordo, ribeirinhos e pescadores documentaram a seca drástica que atinge a Volta Grande e o reservatório da usina, cujas turbinas estão sendo alimentadas pela maior parte da água que deveria possibilitar a reprodução dos peixes nessa época do ano.
Diante do potencial esgotamento definitivo dos bens naturais que possibilitam a sobrevida econômica, física, cultural e emocional do povo beiradeiro do Médio Xingu, a representação protocolada no MPF nesta quinta feira, 18, exige:
1. Que seja instaurado inquérito criminal na Polícia Federal ou ICP no âmbito desta procuradoria, para investigar os CRIMES AMBIENTAIS AQUI RELATADOS, para determinar os responsáveis pelos delitos que resultaram, inter alia, na assinatura do citado Termo de Compromisso de 08/02/2021, inclusive as responsabilidades diretas do Sr. Eduardo Fortunato Bim, Presidente do IBAMA, e do Sr. Paulo Roberto Ribeiro Pinto, Presidente da Norte Energia, S.A., e posteriormente, verem-se denunciados, processados e condenados na forma da lei;
2. A propositura de Ação Civil Pública com pedido liminar em face do dano socioambiental resultante das ações lesivas da Norte Energia e órgãos ambientais envolvidos, contemplando entre seus objetivos (i) a suspensão dos efeitos do Termo de Compromisso assinado entre IBAMA e NESA em 08/02/2021, referentes à insistência na utilização do fracassado “Hidrograma de Consenso”; (ii) a retomada do hidrograma provisório indicado pelo Ibama no Parecer Técnico nº 133/2019-COHID/CGTEF/DILIC e em vigência nos meses de outubro 2020 até janeiro 2021, por tempo indeterminado até que se proceda com (iii) a revisão do Hidrograma de Consenso de forma definitiva por um painel de especialistas com debate democrático amplo e participação de equipes técnicas do MPF e DPU/DPE, a fim de se comprovar a validade ecológica dos volumes propostos.
3. Que seja questionada formalmente a legalidade do Parecer 56/2018/Decor-CGU do Advogado-Geral da União, que afirma que a “celebração pela Administração Pública Federal de termo ou compromisso de ajustamento de conduta em matéria ambiental deve circunscrever-se a interesses de natureza extrapatrimonial e a objeto limitado a “condições de tempo, lugar e modo” ínsitas a obrigação legal imponível ao compromissado” – inclusive pelo fato do mesmo ter utilizado pelo IBAMA e pela Norte Energia para justificar o referido Termo de Compromisso de 08/02/2021.
4. Que seja recordada a decisão vinculante da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que determina ao estado brasileiro, em todas as suas entidades e agências, o cumprimento das medidas necessárias para que se garanta a vida, a integridade e a saúde dos povos indígenas da bacia do Xingu afetados por Belo Monte, a qual estaria sendo descumprida com o referido Termo de Compromisso.
5. A propositura de ações e outras medidas necessárias para coibir as violações de direitos associadas à prevalência de interesses econômicos da Norte Energia, e assegurar as reivindicações das comunidades indígenas, ribeirinhos, pescadores/as e agricultores/as atingidas pelas ações e omissões da norte energia e o poder público;
6. A inclusão do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Caixa Econômica Federal (CEF) e outros financiadores do Complexo Belo Monte no polo passivo de Ação Civil Pública e outras eventuais ações do MPF que têm como objetivo a prevenção, mitigação e reparação de danos socioambientais provocados pelo Complexo Belo Monte, especialmente na região da Volta Grande do Xingu, considerando a sua objetiva co-responsabilidade civil por dano ambiental estabelecida pelo artigo 14, § 1º da Lei 6.938/81, em conformidade com o § 3º do artigo 225 da Constituição Federal.
7. Que esta procuradoria envie cópia dos autos para a Força-Tarefa Amazônia do MPF, à DPU e DPE acerca das conclusões das investigações;
8. Requer a intimação das comunidades, cidadãos e cidadãs que assinam a presente representação, acerca das providências adotadas.
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