Direitos Básicos: a dura queda de braço entre a prefeitura que nega, e a comunidade que exige

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Rio Iriri (Foto: InfoAmazônia)

Por Eraldo Paulino
As comunidades ribeirinhas que vivem na área entre os rios Iriri e Arara, em Altamira, vêm enfrentando uma série de negação de direitos, principalmente depois que a hidrelétrica de Belo Monte começou a destruir a bacia do Xingu. Uma população Xinguara que aprendeu a viver do e com o rio, mas que atualmente sai para pescar e não consegue peixe; toma banho no rio e adoece; e quando adoece não tem sequer atendimento básico de saúde. Até o direito a ir à escola está comprometido.

Este foi o quadro apresentado pela Comunidade da Baiana a varias organizações que apoiam a luta por reparação dos afetados pela usina, em meados de março. “Nós tivemos nossas vidas e nossa renda prejudicadas diretamente pela construção na barragem do rio Xingu, mas não somos reconhecidas como impactadas pela Norte Energia ou pelo governo. Desde que o negócio começou a apertar nós procuramos por nossos direitos. Pegamos muito chá de cadeira de secretários, mas tenho muita fé que as coisas vão dar certo”, explicou Maria de Fátima, a  Baiana, liderança local.

No dia 24/03, em atividade do projeto “Sentir Mais”, da igreja Adventista do Sétimo Dia, Baiana conseguiu reunir na ilha do Chicote um grupo de apoiadores e servidores municipais – como a faculdade de medicina da UFPA,  a Secretaria Municipal de Saúde, a Secretaria Municipal de Educação e o Movimento Xingu Vivo – para discutir a implementação de políticas públicas básicas, negadas à grande maioria das comunidades afetadas por Belo Monte.

Mutirão na Ilha do Chicote reuniu apoiadores da luta dos afetados por Belo Monte (Foto: EP)

O caso da Ilha do Chicote é emblemático. No início de março, a comunidade teve uma pequena vitória com o deferimento de uma Ação Civil Pública do Ministério Público do Estado, explica Antonia Melo, coordenadora do Xingu Vivo, que obrigou a prefeitura a disponibilizar duas vezes por semana o serviço de transporte de enfermos com uma “ambulancha”, e exigiu a apresentação de um projeto para construção de um posto de saúde para atender a região. “Em todas as reuniões do promotor do MP com as secretarias municipais, a justificativa da prefeitura para continuar negando direitos básicos aos moradores era que não tinha projeto nem orçamento pra solucionar os problemas. Então o promotor recorreu à justiça, e a resposta positiva veio muito por causa da pressão que as comunidades vêm fazendo em todas as reuniões e audiências”.

Apesar da decisão judicial, no entanto, nem a ambulancha nem o projeto do posto de saúde foram providenciados pela prefeitura. “A comunidade aguarda a volta do promotor do caso, Daniel Bona, para cobrar o cumprimento da medida judicial”, explica Antonia Melo. Além disso, agrega, a pedido do Ministério Público Federal, o Instituto Evandro Chagas já retirou amostras da água que comprovem a degradação do rio, para cobrar do poder público e da Norte Energia medidas compensatórias à comunidade.

Educação
Todos os dias, Nielk Silva da Rocha, de 14 anos, chega atrasado à escola. Mas não recebe bronca e sim água. Já sob as primeiras quentura do sol – e depois no período mais quente do dia -, o adolescente precisa caminhar 12 km ida e volta de sua casa até o ramal onde o transporte chega para recolhê-lo, para pode estudar.

Este é apenas um dos problemas das comunidades do entorno do Iriri, explicam os moradores. Quando Nielk, hoje no 7º ano, concluir o Ensino Fundamental, caso a família não tenha como mantê-lo em Altamira ou outro município polo, ele provavelmente será obrigado a abandonar os estudos. “Das minhas amigas na comunidade da ilha do Florêncio e das comunidades próximas, nenhuma nem sonha em fazer o Ensino Médio porque não tem escola próximo, nem transporte”, lamenta Mayra Alves, de 15 anos.

Um dos presentes no dia “Sentir Mais”, na Ilha do Chicote, foi Ângelo Alberto dos Santos, coordenador pedagógico na área de reservas extrativistas e ribeirinhas da Secretaria Municipal de Educação de Altamira (SEMED). De acordo com ele, seria preciso reformar um barracão e verificar a disponibilidade de professora para garantir às comunidades o direito a ter uma escola na região – o quer facilitaria ao menos a locomoção das crianças e, com isso, solucionaria o problema de falta às aulas.

A comunidade reagiu rápido. “Nós nos organizamos e, durante dias depois da visita do seu Ângelo, os moradores se esforçaram pra reformar o barracão, ajeitar o telhado e o banheiro, e fazer uma boa estrutura para receber as crianças. E conseguimos a Preta [Franciele Freitas dos Santos] para dar aula. Mas quando viemos cobrar da prefeitura, falaram que não têm como botar a escola pra funcionar ainda. Mas nós exigimos que funcione, se não em maio, no mais tardar no segundo semestre, porque é nosso direito”, explicou Baiana.

Em resposta à pressão popular, a prefeitura agendou para o próximo sábado, 13 de abril, uma reunião com a comunidade para negociar a situação. Baiana afirma ainda que, além de querer a escola funcionando o mais rápido possível, as famílias da localidade não abrem mão de que seja Preta a professora. “Porque se for alguém de fora, não sabemos se ela vai dar conta de estar todos os dias lá pra dar aula, já que a prefeitura já demonstrou que tem dificuldades para garantir transporte”, pondera o ribeirinho Leivaldo de Almeida.  Segundo ele, durante a conversa com a Secretaria de Educação, realizada na última segunda, 08/04, ficou claro que a prefeitura não garantiu respeitar a indicação das comunidades para o cargo de professora, mas esse é um dos pontos que as lideranças populares não pretendem negociar. “Queremos alguém que seja do nosso meio e conheça nosso povo e nossa realidade”, concluiu.

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