Com a saída de Marina Silva (PV) da corrida presidencial e a disputa entre dois candidatos cujas principais propostas não estão baseadas na bandeira da sustentabilidade, a agenda verde perdeu peso no segundo turno da campanha eleitoral (UOL Eleições, Andréia Martins, 25.10.2010).
Ao longo da campanha, Serra fez chegar ao público propostas ligadas a economia, segurança e saúde enquanto Dilma bateu na tecla do acesso aos bens de consumo e do continuísmo da política e dos programas sociais do governo Lula.
O meio ambiente e assuntos como a exploração do pré-sal, a construção da usina de Belo Monte e o novo Código Florestal, ganharam espaço mais considerável na agenda dos presidenciáveis apenas nas duas primeiras semanas após o primeiro turno. Tucanos e petistas disputavam a preferência de Marina – que teve 20 milhões de votos no primeiro turno – e do PV, que acabaram se declarando independentes. Depois, a agenda verde perdeu peso.
“Ficou um espaço muito pequeno ou em branco [para o meio ambiente]. Não tem compromisso. Não há nenhuma proposta concreta, nenhuma agenda mais clara”, avalia Márcio Astrini, coordenador do projeto Amazônia, do Greenpeace.
Nessa semana, a organização apresentou aos dois presidenciáveis – a Dilma, em Brasília, e a Serra, em Ponta Grossa – uma carta com propostas relacionadas ao meio ambiente. Nenhum dos dois candidatos assinou a carta.
Já o economista e conselheiro da ONG WWF, José Eli da Veiga, da FEA-USP, avalia que “programaticamente, não há diferenças entre as candidaturas do segundo turno” na área.
“Eu não avalio o espaço dado à discussão do meio ambiente pelas respostas dadas ao programa apresentado pelo PV”, diz o economista ao comentar que ambas as campanhas, tanto a de Serra quanto a de Dilma, se negaram a assinar o compromisso de “por fim aos leilões das termoelétricas de óleo diesel e carvão mineral e aos investimentos em energia nuclear depois da construção de Angra 3”. “É a insustentabilidade como proposta de campanha”, completa Eli.
Código Florestal: concordância entre os presidenciáveis
Dentre os temas que mais ganharam destaque na campanha, na área do meio ambiente, como a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, a exploração do Pré-Sal e o novo Código Florestal, este último foi o único sobre o qual os presidenciáveis se posicionaram.
As mudanças no código geraram críticas por parte de ambientalistas. Entre as principais estão anistia a agricultores que desmataram até 2009, a redução da distância mínima da área de preservação permanente (APPs) até a margem de rios e a inclusão dessas APPs na soma para o cálculo da área mínima de reserva legal em propriedades rurais. Tanto Dilma quanto Serra concordaram com os pontos apresentados pelos ambientalistas e se posicionaram publicamente sobre o assunto.
“É o único tema que entrou na pauta porque envolve o eleitorado, políticos e patrocinadores de campanha que, por exemplo, têm problemas com o Ibama em seus negócios”, diz Astrini.
Com relação aos outros temas, o tucano questionou a “falta de transparência” na construção de Belo Monte, sem destacar o caráter ambiental da obra, e fez o mesmo com o pré-sal, dando mais destaque à distribuição dos royalties do petróleo aos Estados do que o modo de exploração. No segundo turno, ao receber apoio dos verdes Fernando Gabeira (PV-RJ) e Fábio Feldman (PV-SP), na última semana, prometeu “rever” pontos polêmicos de Belo Monte.
Já Dilma, defendeu a obra da nova hidrelétrica – capitaneada pelos recursos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) – e o pré-sal, alegando que ele vai trazer recursos financeiros para educação, segurança, saúde, entre outros.
Meio ambiente não é elemento decisivo
“A questão não é reconhecer se o tema é importante, mas sim o quanto ela é importante para você”, diz o coordenador de projetos do Greenpeace. Para ele, “é difícil colocar o problema do desmatamento na Amazônia num prato de comida de quem está aqui em São Paulo”. “Tem de haver uma tradução cotidiana do assunto”.
Mesmo com o pouco espaço dedicado ao tema, Astrini acredita que o assunto ganhará mais destaque. “Mas não é um assunto que vai definir uma eleição”, diz ele, que completa: “e ainda temos temas imbatíveis na campanha, como a bexiga d’água, a fita crepe, aborto, Paulo Preto, assuntos que trancam a pauta”.
Para Veiga, a “agenda socioambiental” só vai atingir o eleitorado quando outras questões básicas forem atendidas. “O Brasil tem problemas de esgoto, por exemplo. Como você vai chegar a uma favela e falar de aquecimento global para alguém que não tem saneamento básico?”, questiona.
O economista ainda acrescenta que mesmo no caso de Marina, os 20 milhões de eleitores não foram motivados pela agenda verde. “Apenas 10% desse eleitorado é muito vinculado ao tema. O resto se deve a outros fatores”.
Desafios do próximo governo
Para Márcio Astrini, o principal desafio do próximo presidente será ajustar o “modelo de desenvolvimento”. “Ela [a questão ambiental] pode não ter chegado ao eleitor, mas chegou aos negócios. O Brasil hoje é o maior exportador de carne e muitos empresários estão com problemas no modelo de negócio, devido às regras ambientais”, disse o coordenador de projeto.
Além disso, há também questões como a hidrelétrica de Belo Monte e a exploração do Pré-Sal. “Belo Monte é só um exemplo de uma obra de impacto grande e com uma solução pífia”, diz Astrini. Sobre o petróleo, ele argumenta que o Brasil está atrasado em relação ao resto do mundo.
“Estamos investindo em petróleo enquanto o mundo está caminhando para outra matriz energética. O Brasil tem condição de dar um banho investindo em energia solar e eólica”, comenta. Para ele, o grande desafio do próximo presidente é provar “quanto desse esperado retorno do pré-sal irá de fato para [investimento em] novas energias”.